Um suspiro. Foi como tudo começou. Olhou-o de longe e ele não notou. Nem no começo, nem no fim. Mas ela o acompanhava de soslaio. Sorrateiramente, como só ela sabia fazer.
“Eu quero guardar teu beijo na concha das mãos…”
Ele mandou um beijo de longe. Mentira. Ele sorriu para ela. Verdade. Mas ela não viu porque estava muito ocupada olhando para o chão.
“Sou alvo pros teus olhos claros parecidos com essa estação…”
Ele a olhava, ela sabia. Mas quanto? Como era esse olhar? Curiosidade? Receio? Desejo? Assombro? Encanto? Podia ser de amor.
“Adoro os efeitos sonoros de quando você sussurra absurdos no ouvido do meu coração…”
Dali uma história nasceu. Apenas para ela. Os mil diálogos, as dez mil situações, os vinte mil encontros, os infinitos quero você só para mim.
“Se eu corro, eu corro demais só pra te ver, meu bem…”
Foram poucos dias. Nunca mais o viu. Mas queria vê-lo de novo. Um dia sim, no outro, também.
“É que eu quero um socorro.”
Olhos nos olhos. Um para o outro. Acredite, faria toda a diferença. Porque aí sim seria apenas o começo. Um começo de verdade.
*
Os trechos são da música “Se eu corro”, de
A banda mais bonita da cidade. Para ouvir,
aqui.
Ela mal havia se levantado e o dia lhe disse: é hora de voltar a se apaixonar. Suspirou como há muito não fazia. Sentiu-se bonita novamente. Sorriu da maneira mais leve que conseguia. Queria sentir tudo de novo.
Saiu para passear. Antes de voltar, passou no supermercado para comprar gulodices. Na fila, uma moça e um rapaz estavam à sua frente. O rapaz saiu para ver as gôndolas. A moça ficou. E começou a falar.
Contou sobre o namorado. Sobre a chatice do namorado. Sobre o ciúme do namorado. Sobre uma grande briga entre os dois. Enquanto a moça falava, ela escutava. Por fora, sorria e concordava. Por dentro, sentiu uma leve vertigem. Quanto mais ouvia sobre as agruras daquele relacionamento, mais a angústia que viveu por tantos anos voltava ao seu pensamento. Logo hoje, que acordei querendo me apaixonar de novo.
A moça perguntou seu nome, disse o dela, pagou suas compras, pegou o namorado e partiu. Ela partiu em seguida.
Chegando em casa, pensou na história que ouvira. Apesar da vertigem na fila do supermercado, o desejo não havia passado. Ela sorriu novamente. Quer amar de novo.
Ela sabia que esse dia chegaria: a dor finalmente passou.